Memória

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A gente pára e olha para o passado, enxerga as coisas, todas postas sobre a mesa, todas tortas, deixadas lá. Pegamos com as mãos ainda não trêmulas, lembrança por lembrança, espia cada uma, analisa, observa, devolve à mesa, com a quase estranheza de quando a viveu experiência. Naquele tempo doeu, rasgou, deliciou, chorou, sorveu. Agora lembranças pasteis, ex cor africanidade, ex brilhantismo de sol. São como véus de transparência opaca, no balanço câmara lenta do vento da janela aberta. A poeira lá fora ainda passeia pelo ar. Tudo parado, congelado, nessa arrumação de dança de tempo. As lembranças expostas, colocadas umas sobre as outras, são como corpos de guerra deixados no esquecimento. Batalha final sem fim.
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2 comentários:

Lu Carrijo disse...

Que lindo Leli! Inspirador.
Então, deixo um poema da Lya Luft para fazer companhia ao seu poema.

Bjs, Lu

Convite
(Lya Luft)

"Não sou a areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério

A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério."

Carrijo disse...

Muito lindo...
De fato, muito parecido com o que estávamos conversando sobre as lembranças que surgem em nós... gostei dos objetos expostos sobre a mesa...
Bjs. Li